Repúdio ao racismo

Publicação: 10/07/2016


De forma brutal, os Estados Unidos voltaram a enfrentar um problema histórico: o racismo. A morte de dois negros em duas abordagens policiais revoltou milhões de norte-americanos, escandalizados com a violência empregada pelos homens da lei. Em uma característica dos tempos modernos, os dois episódios foram gravados em vídeo e tiveram as imagens distribuídas nas redes sociais. A imediata repercussão elevou mais uma vez a tensão social na sociedade norte-americana, de tal forma que o presidente dos Estados Unidos, o negro Barack Obama, manifestou o repúdio à execução de dois cidadãos. “São sintomas dos nossos desafios em nosso sistema de Justiça criminal, da disparidade racial que se apresenta em nosso sistema”, disse. A candidata democrata Hillary Clinton foi mais contundente: “Alguma coisa está profundamente errada quando tantos americanos têm razão em acreditar que nosso país não os considera preciosos como os outros por causa da cor da pele”.

O desdobramento dos dois assassinatos não poderia ser pior. Na noite de quinta-feira, em Dallas, um franco-atirador matou cinco policiais e feriu mais sete durante passeata em protesto contra a violência policial. Micah Johnson, soldado que serviu no Afeganistão, disse, antes de ser abatido, que pretendia matar brancos, de preferência policiais. Em repúdio ao assassinato de policiais em Dallas, a procuradora-geral dos Estados Unidos, Loretta Lynch, alertou para a necessidade de se interromper a escalada da violência. “Não vamos nos precipitar para que este seja o novo normal do país. Temos que refletir sobre o que queremos ser como país, que sociedade queremos deixar para nossos filhos”, disse Lynch, que é negra.

Estados Unidos e Brasil guardam histórias distintas em relação à desigualdade racial. É certo que ambos tiveram escravidão, mas o país do Norte iniciou mais cedo o processo de valorização dos direitos civis e das ações afirmativas em favor de negros. Em resposta à discriminação explícita contra os negros, traduzida por grupos extremistas como o Ku Kux Klan e por práticas amplamente adotadas como assentos separados em ônibus, o movimento negro nos Estados Unidos tornou-se instrumento político para defender mudanças na sociedade norte-americana. Nos últimos anos, ganhou relevância o movimento Black Lives Matter (Vidas de negros importam). Esse processo é contínuo, mas, como se vê nos episódios da semana passada, está longe de pacificar o convívio entre cidadãos nos Estados Unidos.

No Brasil, a valorização dos negros e o combate ao racismo ainda são difusos e diletantes. É considerável o esforço em se estabelecer cotas para o ingresso em universidades, mas trata-se de ação discreta ante a profunda desigualdade que ainda marca o país. Negros são os que mais sofrem com o desemprego. A porcentagem de negros em cargos executivos em empresas é ínfima. Negros são minoria em ministérios ou no Congresso. Negros são as maiores vítimas de violência. A probabilidade de um negro ser assassinado é oito vezes maior do que a de um branco. São frequentes no noticiário denúncias de injúria racial. O Brasil, assim como os Estados Unidos, precisa dar um basta a essa injustiça social.

Fonte: http://impresso.correioweb.com.br/app/noticia/cadernos/cidades/2016/07/10/interna_cidades,211919/eixo-capital.shtml